segunda-feira, 3 de dezembro de 2012

Quando a derrota se torna mais interessante que a vitória


Ao longo da história, o futebol brasileiro sempre foi pródigo em presentear os torcedores com regulamentos esdrúxulos, para não falar das famigeradas viradas de mesa que vez ou outra assombravam o esporte nacional. Com o advento do Estatuto do Torcedor (Lei nº 10.671, de 2003), a situação melhorou um pouco. Passou a haver um maior respeito ao mérito desportivo e, principalmente, uma segurança com relação ao cumprimento dos regulamentos.

Os nossos dirigentes, entretanto, continuam sendo, em sua maioria, os mesmos. Aqueles de tempos em que os regulamentos podiam ser rasgados ou de fórmulas de disputas mirabolantes. Vez ou outra, ao que parece, eles tentam voltar a exercer aquela criatividade caricata de outrora. Eis que a Confederação Brasileira de Futebol (CBF) resolveu presentear os torcedores com um regulamento curioso. Uma fórmula em que, por mais incrível que possa aparentar, a derrota se tornará, para alguns clubes, mais interessante que a vitória.

Com a reformulação do calendário do futebol brasileiro, a Copa do Brasil teve seu período de duração estendido e, desta forma, ocorrerá de forma concomitante com o Campeonato Brasileiro, a Copa Libertadores e a Copa Sul-Americana. Pois bem, ao contrário do que acontece na Europa (em que um clube disputa o campeonato nacional, a copa nacional [e a copa da liga, no país em que existe] e o torneio continental), no Brasil, o clube que quiser disputar a Copa Sul-Americana de 2013 não poderá se classificar para as oitavas de final da Copa do Brasil. Por conta do calendário genial de nosso futebol, é inviável que um clube dispute os dois torneios.

Diante disto, chega-se a uma aberração sem precedentes: um time poderá entrar em campo para perder! Ou seja, ao contrário do que é lógico e natural no esporte, que é a busca pela vitória, o clube que quiser disputar um torneio continental terá que abrir mão da vitória em uma competição nacional (optando pela derrota desportiva).

Essa regra é uma contradição diante do modelo desportivo no qual o futebol brasileiro encontra seus alicerces e sua estrutura. No que diz respeito à forma de disputa de nossas competições, nós nos inserimos no sistema vertical.

Como se estrutura o sistema vertical?

O sistema vertical encontra seus pressupostos no mérito desportivo, quer dizer, na obtenção dos resultados desportivos em uma competição a fim de se ascender ou descender, bem como de se obter classificação a uma competição internacional.

As competições ocorrem simultaneamente, e um clube pode ser campeão ou chegar a uma competição internacional, como, ao mesmo tempo, corre o risco de ser rebaixado; enquanto que um clube de divisão hierárquica inferior pode ascender através de suas conquistas desportivas e, um dia, almejar chegar a uma competição internacional.

A regra de classificação para a Copa Sul-Americana é uma contradição ao próprio sistema em que o futebol brasileiro está inserido e no qual encontra sua base de sustentação (jurídica, lógica e, acima de tudo, desportiva).

Exemplo prático da aberração:

O Náutico disputou a Copa Libertadores da América em 1968. Os torcedores alvirrubros se orgulham de dizer que são os pioneiros do estado de Pernambuco na mais importante competição da América do Sul.

Com a boa campanha no Campeonato Brasileiro de 2012, em que terminou na 12ª colocação com 49 pontos, o Náutico tem a possibilidade de, em 2013, voltar a ser o pioneiro de Pernambuco em outra competição continental. Desta vez, a Copa Sul-Americana.

Entretanto, para poder disputar a Sul-Americana, o Timbu poderá se ver diante de uma situação em que terá que PERDER na Copa do Brasil para participar da competição continental.

Chegando à terceira fase da Copa do Brasil 2013, o Náutico terá que optar entre prosseguir na competição nacional ou preferir ser eliminado para, assim, ter o direito de disputar a Copa Sul-Americana e, desta forma, concretizar o sonho de voltar a uma competição nacional (novamente na condição de pioneiro em seu estado).

Entenderam o contrassenso da regra? Em nosso modelo desportivo, o grande objetivo é a busca por vitórias e títulos. O sucesso desportivo (ganhar jogos, ser campeão) está acima de tudo, dentro da lógica da estrutura do nosso futebol.

Estava. A CBF criou uma fórmula em que perder pode ser melhor do que vencer. Uma regra em que um clube entrará em campo à procura não da vitória, mas sim à espera da derrota.

É ou não é uma aberração?

Náutico será único pernambucano na elite pela oitava vez


Ontem, o Náutico venceu o Sport por 1 x 0 e rebaixou o rival para a Série B. Em 2013, o Náutico será o único representante de Pernambuco na Série A. Com isso, o clube alvirrubro será o único pernambucano na elite do futebol nacional pela oitava vez na história. Iguala-se, assim, ao próprio Sport.

Vale ressaltar que eu levo em consideração todos os campeonatos nacionais a partir da Taça Brasil de 1959, de acordo com a unificação da própria CBF (que ocorreu em 2010). É por conta dessa unificação, por exemplo, que todos se referem ao título do Fluminense como o quarto nacional de sua história. Sobre o tema, é possível ler minha opinião aqui: http://conversasfutebolisticas.blogspot.com.br/2012/05/unificacao-dos-titulos-do-campeonato.html

É possível que se diga que entre 1959 e 1970 (Taça Brasil e Taça de Prata – Robertão), não havia segunda divisão. É bom lembrar, então, que de 1973 a 1979 só houve a 1ª Divisão. Para não falar de campeonatos como os de 1987 ou 2000 (cada um com sua peculiaridade).

Por fim, mesmo que você queira insistir que não se devam levar em consideração as Taças Brasil e de Prata, 2013 não será o primeiro ano do Náutico como único pernambucano na Série A/1ª Divisão. Em 1990, o alvirrubro foi o único representante de Pernambuco na elite nacional.

Náutico, 8 vezes: 1961, 1964, 1965, 1966, 1967, 1968*, 1990 e 2013
Sport, 8 vezes: 1959, 1962, 1963, 1995, 1996, 1997, 1998 e 1999
Santa Cruz, 3 vezes: 1960, 1969 e 1970.

*O Náutico foi o único pernambucano tanto na Taça Brasil quanto na Taça de Prata (Robertão).